sexta-feira, 4 de junho de 2010

Os Guetos de Livre Mercado Brasileiros


Em várias capitais de nosso país há um local para onde os consumidores rumam quando desejam comprar algumas importantes quinquilharias eletrônicas, aparatos modernos, enfeites de mau gosto e outros badulaques. Hoje fui à famosa feira dos importados de Brasília. Por conta do dia dos namorados que se aproxima e do feriado da última quinta-feira, a também denominada "Feira do Paraguai" como carinhosamente chamam-na os Brasilienses mais antigos, estava abarrotada e não havia mais vagas nos Estacionamentos das cercanias. Até achei bom ter usado o péssimo serviço de transporte público da capital federal, não precisei passar longos minutos procurando lugar para estacionar, nem me esquivar de incomodos guardadores de carros.

No final da década de 90, ano de 1998 a feira dos Importados, se moveu buscando maior profissionalização. Antes disso, o sítio da feira se encontrava no estacionamento entre o Estádio Mané Garrincha e o autódromo Nelson Piquet. Ficava bem perto do Colégio Militar de Brasília inclusive, eu mesmo fui à feira depois das aulas, essa atividade causava um pouco de mal estar entre os nossos superiores no colégio pois não era de bom tom alunos fardados perambulando entre artigos de procedência por vezes duvidosa e SEM a COBERTURA (que é a obrigação que tinhamos de usar a boina garança em espaços abertos)! A situação da feira era mais típica do que é hoje: formada por um amontoado de pequenas barraquinhas de camelô com uma cobertura de lona que refletia um amarelo-alaranjado sob um sol escaldante e formava um efeito estufa muito incômodo e peculiar, que nos fazia nos sentir dentro de uma sauna, como parte orgânica da feira. Hoje quem for à Brasília deve ir à "Feira dos importados", sem dúvida um ótimo passeio, agora a feira possui uma boa infraestrutura, conserva ainda os corredores apertados das entre lojas, invadidos por camisas e produtos made in China, os produtos estão organizados (nem tanto) em quatro grande blocos de aço pre-armado identificados por letras números e cores, nada do caótico número de lojas que havia na improvisada feira de outrora. A feira agora possui em volta bancos e vários empreendimentos comerciais estabelecidos que pagam impostos.

Impostos sobre impotação são o motivo para o surgimento desses guetos do livre comércio no Brasil. Em Belo Horizonte, o point mais conhecido é o Shopping Oiapoque e o shopping Xavantes, um ao lado do outro. No rio a Feira da rua Uruguaiana, em São Paulo é a 25 de Março e outros points quentes. Felizmente, essas medidas são muito melhor do que os camelôs pelas ruas, as feiras organizadas centralizam a procura (lá tudo se acha) e não importunam os consumidores não interessados. Ano passado em Belo Horizonte precisei comprar um deck porta-cds e dvds. Um artigo muito simples. Procurei em cinco papelarias e não encontrei o que queria, eu procurava um com lugar para no mínimo 20 cds, nas papelarias encontrei tímidos decks de 10 compartimentos, gostos nada sóbrios (um deles era coberto de um vinil maleável e azul claro imitando uma calça jeans) e custavam por volta de R$ 20,00. Fui descendo as ruas de Belo Horizonte, procurando nas papelarias até chegar muito próximo do shopping popular onde encontrei um deck de 40 lugares por apenas R$ 5,00. A mulher da loja nem me deu nota fiscal mas foi lá que encontrei o que procurava e não havia achado em nenhum outro lugar.

Esse fenômeno das feiras de importados ocorre por conta de nossas barreiras à importacão. O brasileiro paga, em média, 7,9% em impostos sobre produtos importados. Alguns produtos quase não pagam impostos como o Trigo que o Brasil necessita importar grande parte e até o momento tem tarifa zero. Outros produtos, como os itens tecnológicos não manufaturados dentro de nossas fronteiras, chegam a pagar mais de 100% de impostos. Já falei aqui nesse blog como o Ipod alcança um dos mais altos valores quando se compara internacionalmente. Os produtos brasileiros são extremamente caros. Recentemente comprei no Paraguay uma câmera de vídeo digital por R$ 169,90. No Brasil, a mesma câmera é encontrada não por menos de R$ 690,00.

No Paraguay, país que batiza a nossa feira de Brasília, as taxas média de importação são de apenas 3,3%. Poucos países latino americanos possuem taxas tão altas como as do Brasil, a Argentina que vem passando por um retrocesso nesse campo possui taxas de 5,3%, o Uruguay tem mantido uma política monetária e fical mais responsável e tem taxas de importação de 3,6%, o México já alcançou níveis de 1,5%. Bastante similar ao nível norte-americano que é de 1,5% e de 2,8 na União Européia.* Longe ainda das cidades-estado baluartes do open market: Cingapura e Hong Kong, que possuem zero de tarifa de importações.**

Os dados sobre a tarifa média sobre importações que utilizo aqui são do Economic Freedom Index da heritage.org. Creio que os dados deles são um pouco anêmicos e substimam a tarifa média de importações no geral. Segundo outra contabilização que aparece nessa reportagem da revista Exame, a tarifa média de importação do Brasil seria algo próxima de 11%. Uma equipe de pesquisadores do IPEA, Kume, Piani e Miranda (2008), estimaram a relação que há entre maiores alíquotas à importação fiscal e à evasão de impostos. Quando os impostos são altos as importações tendem a ser declaradas em um subvalor. Na estimativa geral os autores concluem que o acréscimo de um ponto percentual na alíquota de impostos provoca uma redução de cerca de 3,2% na arrecadação. Eu diria que um possível questionamento interessante a se fazer é quanto esses impostos não provocam de contrabando e estímulo à pirataria.

Muitas das feiras hoje legalizadas se mantinham pela origem ilegal de seus equipamentos, produtos de contrabando, ainda hoje há muita vista-grossa para esses produtos, simplismente porque reprimí-los todos tornaria nossa vida muito pior, pagando ainda mais pelos já altos preços dos artigos de tecnologia e alguns outros "superfluos" encontrados nessas feiras. A polícia tem feito uma grande repreensão à pirataria presente nas feiras, mas a polícia não tem como estar lá o tempo todo e uma medida que ajudaria bastante à combatê-la seria a redução aos impostos de importação. Esses maravilhosos guetos do livre comercio se desenvolvem em cada capital do nosso país justamente porque nossos impostos são elevados, são os impostos que levam às feiras do Paraguai. E são também por causa deles que milhares de brasileiros fazem um périplo para Cidade del Este e Pedro Juan Cabalero para se aproveitar das oportunidades de negócios que poderiam ser criadas internamente no Brasil, sem o custo desse sacrifício de muambeiros em seu trabalho de formigas.


Visualizar Meus lugares salvos em um mapa maior

Para imaginar situações absurdas a que os impostos impôem, sabe-se que o Paraguay não possui portos marítimos, as mercadorias chegam lá subindo o estuário do prata e o rio paraná, por meio de avião ou das linhas férreas e rodovias que passam pelo Brasil. Um dos portos mais usados pelo Paraguay é o Porto de Paranaguá. Imagine que um carregamento de "Made in China" chega ao Porto de Paranaguá e faça uma viagem de mais de 12 horas por longos 730 Km para chegar à Ponta del Este. Suponha ainda que parte dessas mercadorias se destinem à consumidores Brasileiros na 25 de Março em São Paulo, o comerciante terá de fazer uma viagem ida e volta de 1.200 km em cada trecho. Ao final são gastos 3.130 Km para essa mercadoria chegar à São Paulo. Se o carregamento fosse direto de Paranaguá até lá, seriam apenas 450Km. O resultado é que 2.680 km foram rodados só para evitar os impostos. Esse raciocínio se torna ainda mais dramático e ilustrativo caso a mercadoria chegasse pelo porto de Santos. Ao fim, o país deixa de gerar grande volume de renda internamente. Satisfeitos ficam os importadores paraguaios, insatisfeitos todo o mercado consumidor do Brasil.

Bom, o que aconteceria caso o país não tivesse tão elevados impostos de importação? Ou pelo menos não tão mais altos do que nossos vizinhos de mercosul? Esse produtos seriam vendidos em lojas comuns em vários centros de consumo espalhados, o contrabando e evasão diminuiriam, as pessoas não precisariam deslocar para aquele lugar da cidade onde se encontram as bugigangas, elas seriam achadas a um preço mais acessível e justo em qualquer loja de shopping. As Feiras que eu tanto gosto de ir (pois elas tem um lado pitoresco muito interessante) teriam de lutar para marcar o seu diferencial, na verdade elas teriam de vender atrações, o "estilo de feira" é que deveria ser vendido. Na feira de importados de Brasília se acha muita coisa legal e típica do norte e nordeste, esse pode ser um diferencial. Mas é bem verdade que o motivo principal dela hoje perderia a razão de ser e teria de lutar com a concorrencia de qualquer esquina. O Paraguay perderia um tanto desse comércio para o Brasil, mas é sabido também que esse comércio traz muitas externalidades negativas para o Paraguay.

Por fim coloco um gráfico aí para mostrar a participação das Exportações e Importações em porcentagem do PIB, o Brasil tem aumentado sua própria participação no comércio exterior nas últimas décadas. Com relação à sua participação no comercio internacional Global ela é ainda pequena e estável, se restringindo a meros 1%. Na décadas de 90 e 2000 o país passou a ser relativamente mais aberto, mas podemos aumentar nosso desenvolvimento ainda mais incrimentando alguns pontos de abertura como a redução das tarifas e promoção dos Investimentos Estrangeiros Diretos, os IDR's.

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